Resenha: Ética no Gerenciamento de Projetos – Novembro/2013
Renata Carboneri Carboni

Diariamente nos deparamos com notícias sobre escândalos éticos: suspeitas de formação de cartel nas licitações do metrô paulistano, ativistas indignados com institutos investigados por protocolos de pesquisa que permitiriam maus tratos aos animais, apenas para citar dois recentes exemplos de grande repercussão. Há 10 anos, Pinedo (2003) já afirmava que existiam poucas empresas realmente éticas atuando no mercado, e infelizmente percebemos que ainda hoje é difícil identificá-las. Como podemos conduzir a sociedade e as empresas para um patamar ético mais elevado?
Ainda segundo Pinedo (2003), o comportamento ético é resultado do crescimento individual e maturidade. Sabemos que a maturidade não é alcançada por métodos tradicionais de aprendizado, portanto não devemos ter a expectativa de que o comportamento ético seja alcançado por estes meios. Cortella (2011) postula que a ética deve ser trazida ao dia a dia da empresa e que os funcionários devem ser incentivados a refletir e agir criticamente acerca das questões que se apresentam.
Eboli (2013) corrobora esta visão, colocando que especialistas propõem exercícios de autodiagnóstico com questões relacionadas a assuntos que gerem dúvidas, tais como: seriam as conseqüências de sua atitude aceitáveis, se você estivesse do outro lado? Antes de tomar uma decisão, você não poderia discutir o problema com as partes interessadas? Como ficaria, se outras pessoas fizessem o mesmo com você? A mesma autora afirma que qualquer organização de grande porte minimamente séria e competitiva já instituiu seu Código de Ética, com as condutas esperadas em todas as esferas de relação entre seus stakeholders. É fato que atualmente não basta a empresa ser excelente no que faz: é necessário legitimar-se em um mercado cada vez mais competitivo através da credibilidade pública.
Observamos em Srour (2008) esta mesma opinião quando ele afirma que as empresas não competem apenas pelo mercado, mas para conquistar boa reputação, procurando obter um crédito de confiança que as permita ter uma vantagem competitiva para incrementar sua rentabilidade. Mas, antes de chegar a esta conclusão, ele traz importantes contribuições na discussão da postura ética, socialmente responsável e sustentável das empresas.
Segundo ele, as empresas estão sendo forçadas a assumir práticas de responsabilidade social e a adotar uma postura sustentável por pressões da sociedade civil. Vivemos na economia do conhecimento na qual há a primazia dos ativos intangíveis. Cada vez mais os bens intangíveis são definidos como bens públicos (por exemplo: tenho acesso a uma notícia na internet ao mesmo tempo em que muitas outras pessoas – meu acesso não impede que outra pessoa usufrua da notícia simultaneamente) e isto redefine as relações capitalistas de propriedade estabelecida há séculos.
Além disso, no mundo “plano” e globalizado em que vivemos, a oferta de produtos e serviços é muito grande e o consumidor tem opções para “boicotar” determinada marca caso não concorde com as práticas da empresa que a oferece. Assim, além de maximizar seus lucros (razão que sustenta o capitalismo), a empresa deve se comprometer e se empenhar em assegurar a qualidade de vida de todos os seus stakeholders, através de governança corporativa, parcerias com todos os envolvidos e gerenciamento dos riscos ambientais.
As empresas devem ser viáveis economicamente, justas socialmente e corretas ecologicamente. Para Pinedo (2003), se uma empresa for verdadeiramente madura ou ética ela será, por definição, socialmente responsável. Mas novamente nos deparamos com a questão: como chegar à maturidade ética buscada?
O primeiro passo de acordo com o autor (2003) é assumir a imaturidade para buscar melhorias. É fundamental também que os líderes empresariais estabeleçam a visão e a compartilhem com todos, mostrando uma conexão entre onde a empresa se encontra hoje e aonde se quer chegar. Os valores elitistas, baseados no conceito de que algumas pessoas são melhores do que outras, devem ser abandonados, uma vez que engessam a organização com sistemas rígidos de valores hierárquicos de poder, e desta maneira as pessoas não conseguem crescer. Se elas não crescem, as empresas não podem amadurecer.
Uma organização ética é uma organização integrada, na qual vivenciamos no mais alto grau nossos valores mais profundos e nos movemos na direção de nossos propósitos. As empresas são o conjunto de seus propósitos e valores e atraem pessoas afinadas com este conjunto!
Saindo do âmbito corporativo, podemos ver a preocupação da sociedade civil pelo tema não só pela pressão observada por Srour (2008) nos últimos anos no Brasil, mas também por outros exemplos, como as disputadíssimas aulas de Michael Sandel em Harvard. O curso do filósofo, escritor, palestrante e professor intitulado Razão Moral 22, mas apelidado de Justiça, é um dos programas de verão mais disputados na renomada universidade desde 2004 (Coronato, 2012).
O curso ganhou um site próprio e foi o primeiro a ser publicado em vídeo por Harvard na internet, em 2009, para atender a uma demanda sem precedentes. Desde o início dos anos 2000, mais de mil pessoas demonstravam interesse pelo curso todos os anos (um quinto disto já caracterizaria uma procura muito grande). Sandel não é um “guru” com respostas prontas. Seu objetivo é apresentar a filosofia como uma ferramenta a ser usada por qualquer cidadão para enfrentar seus dilemas e dúvidas e poder tomar melhores decisões em seu cotidiano, mais um exemplo de reflexão que leva à maturidade e, por conseguinte, a um comportamento mais ético, dentro e fora das empresas.
No vídeo de Dan Ariely, também chama a atenção a lotação do auditório. A instituição organizadora, TED, é reconhecida pelas conferências nas quais o palestrante tem apenas 18 minutos para sua apresentação, de “ideias que merecem ser disseminadas”, mas também pelo valor alto que os participantes pagam para vê-las ao vivo. Em sua fala, Dan coloca que nossa intuição deve ser sempre testada, repensada. Através de sua própria história de vida, marcada por uma longa internação em função de queimaduras que sofreu em um acidente, afirma que, apesar de boas intenções, por vezes agimos de forma errada. Mais uma vez temos o exemplo de que a reflexão e questionamento sobre nossa ação e intuição levam à melhores resultados.
Como bem colocado por Cortella (2011), a ética não é algo que nos dê conforto, mas algo que nos coloca dilemas. É o que marca a fronteira de nossa convivência. Somente alcançaremos uma sociedade mais ética e madura ao mantermos o compromisso com o nosso próprio desenvolvimento e com a reflexão acerca de nossa conduta como cidadãos e profissionais.

Referências bibliográficas
ARIELY, D.; Vídeo sobre nosso código moral distorcido. Disponível em: . Acessado em 31/10/2013, 20:05.

CORONATO, M.; O filósofo e a justiça. Revista Época, São Paulo, 07 mai. 2012. p. 74-76.

CORTELLA, M.S.; A nossa casa. Quero? Devo? Posso? Três perguntas essenciais para cuidarmos da vida coletiva. Em: Qual é a tua obra? Inquietações propositivas sobre gestão, ética e liderança. 17. ed., Ed. Vozes, 2011, 141 p. (p. 105-108).

EBOLI, M.; Conduta ética versus legal. O Estado de São Paulo, São Paulo, 01 set. 2013. Caderno Empregos p. 2.

PINEDO, V.; Ética e valores nas empresas: em direção às corporações éticas. Em: Instituto Ethos Reflexão, São Paulo, Ano 4, no 10, out.2003.

SROUR, R.H.; Por que empresas eticamente orientadas? Organicom, ano 5, no 8, 1o semestre de 2008.