O Marketing de Lugares – o caso de Macau As mudanças sócio-económicas, ocorridas desde finais do século passado, trouxeram uma nova perceção de valor aos territórios, procurando-se captar recursos financeiros para dinamizar a economia de um determinado local e implementando estratégias conducentes à satisfação de necessidades de grupos “alvo”, nomeadamente cidadãos, turistas e investidores. Cada vez mais os países, cidades e regiões competem entre si em termos de imagem, com o objetivo de superarem concorrentes na venda de produtos e serviços e na capacidade de atrair investimentos, negócios e turistas. Neste contexto nasce o “marketing de lugares”. Para a compreensão do fenómeno Kotler, Haider & Rein (1993) e Kanter, (1995) propõem que se tenha em consideração: - A envolvente da cidade, no essencial a sua envolvente macroestrutural; - Os fatores de marketing, ou seja as variáveis influenciadoras do desenvolvimento; - Os atores de marketing; - A análise SWOT; - A missão, vocação, objetivos e as estratégias; - Os mercados-alvo, ou seja a identificação e avaliação dos públicos a que se dirige. O marketing de lugares pretende aumentar a atratividade do público, interno ou externo, procurando desenvolver estratégias de posicionamento. Koetler define quatro objetivos para o marketing de lugares: - Desenvolver um posicionamento e uma imagem forte e atraente; -Estabelecer incentivos atraentes para os atuais e possíveis compradores e utilizadores dos seus bens e serviços; - Fornecer produtos e serviços de maneira eficiente; - Promover os valores e a imagem do local; O mesmo autor indica diferentes níveis de marketing, definindo os principais intervenientes ao nível do planeamento de uma estratégia, os fatores de marketing e os mercados alvo:
Fig1. Níveis do Marketing de lugares – Kotler Um dos casos de sucesso do marketing de lugares é Macau. A região administrativa especial de Macau faz parte integrante da China, desde 1999, ano em que se transferiu a administração do território de Portugal para a República Popular da China. A população de Macau ronda os 592 000 habitantes e nos últimos 20 anos tem registado um crescimento demográfico anual de cerca de 4%, com um impressionante número de visitantes,
em 2012, de 28 milhões de pessoas. Trata-se de uma região com uma economia virada para o exterior, uma baixa taxa de impostos, uma zona aduaneira separada e um porto franco (livre circulação de mercadorias, capitais, divisas e pessoas), sem restrições cambiais. Tem mantido um crescimento económico acelerado com um crescimento real do PIB, no último ano, de 9,9 % e de 18,4% no primeiro trimestre de 2013. O turismo e o jogo são o principal motor da economia macaense, sendo este o sector que mais contribui em termos de receitas tributárias, ultrapassando as receitas das exportações. As autoridades governamentais consideram o turismo como o pilar mais importante da economia do território, projetando Macau como um centro internacional de turismo e lazer, promovendo a diversificação da indústria do turismo na vertente cultural, desportiva, de recreio, conferências, exposições e turismo de negócios. O desenvolvimento do setor de convenções e exposições e a diversificação moderada da estrutura económica de Macau, são duas das principais estratégias de desenvolvimento económico do governo da RAEM. O governo apostou ainda no apoio e organização regular de eventos de grande dimensão , como seja a realização de eventos desportivos de cariz internacional , a realização de várias exposições comerciais e desenvolvimento do turismo de negócios, promovendo uma imagem de marca de qualidade. Apoia ainda, através de subsídios e outros incentivos, a realização de convenções e exposições sobre Macau noutros países. Não obstante, não podemos dissociar o desenvolvimento extraordinário do território à indústria do jogo. Com forte tradição, esta indústria constitui uma das mais antigas atividades de Macau, tendo desenvolvido uma relação muito estreita com o turismo, pelo que se tornou no pilar da economia local. A liberalização do setor do jogo, já em 2002, tem proporcionado novos investimentos e modelos de exploração, criando inúmeros postos de trabalho e injetando no setor um forte impulso e fatores de diversificação. Com efeito, desde 2006 que as receitas brutas desta atividade ultrapassam as de Las Vegas, nos EUA. Isto deve-se ao fim do monopólio, apostandose no desenvolvimento de uma indústria do jogo pela via da concorrência. Os contratos de concessão impunham também uma série de obrigações, como seja a construção de um elevado número de hotéis e outros investimentos, no sentido do desenvolvimento turístico integrado e diversificado, de encontro à estratégia definida. A maior fatia de turistas vem da China Continental, seguindo-se Hong Kong e Taiwan, com uma taxa a rondar os 90%. Esta maior preponderância de visitantes da China continental devese essencialmente à política do “visto individual” que, desde 2003, permite aos continentais deslocaram-se individualmente a Hong Kong e Macau, contornando assim as fortes limitações para sair do território. No entanto os dados demonstram que as visitas à cidade (sightseeing) e não o jogo são a primeira razão pela qual as pessoas visitam Macau, o que reflete as estratégias de marketing das autoridades turísticas da região, que não se centraram exclusivamente no jogo mas antes o “agarram” como âncora no desenvolvimento de outros setores.
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1 - Em 2012 realizaram-se 1022 atividades, com um total de 1.612.961 participantes; 2 - Grande prémio de Macau, Concurso Internacional de fogo de artificio; Festival Internacional de Música; Festival Internacional de Artes e Festival de Gastronomia; Feira Internacional de Macau; Fórum Internacional de Cooperação Ambiental de Macau, etc. 3 – Jogos da Ásia Oriental; Campeonato Mundial de Voleibol Feminino; Jogos da Lusofonia, etc. 4 – Em 2012 operavam no território 67 hotéis e 33 pensões, com um total de 27 761 quartos, em Agosto de 2013.
Embora a fama de Macau como destino de “jogo”, este apenas aparece em quarto lugar no “top five” das principais razões de visita ao território, o que contradiz a crença generalizada que é o principal motivo pelo qual os turistas visitam Macau. Esta aparente contradição é explicada por um estudo sobre casinos em Macau (Asia case research centre) que revela a distinção entre “hard-core” gamblers e turistas que podem visitar os casinos como atração turística. De acordo com o estudo os ganhos líquidos proporcionados pelo segmento dos grandes apostadores, são quase três vezes maiores que os restantes segmentos (Direção de Inspeção e Coordenação de Jogos). O jogo e os casinos são, obviamente, o principal motivo da visita para esses turistas, mas para os restantes são, acima de tudo, uma atração turística. As autoridades macaenses percecionaram bem os mercados alvo principais, trabalhando especialmente a captação de visitantes e turistas, a captação de investimento que, aliado às infra-estruturas criadas, proporcionam melhor qualidade de vida aos residentes e visitantes/turistas, fomentando igualmente o setor das exportações e dos serviços. Aproveitaram, sem dúvida, o regime administrativo especial e a localização geográfica. A sua proximidade e ligação a Hong Kong, Taiwan e à China continental, aliada à concessão do “visto individual”, contribuiu para atrair um elevado número de turistas e visitantes. Parece-me que a natural apetência do povo chinês para o jogo, e as fortes restrições à saída do país, aqui amenizadas pelo “visto individual”, contribuíram fortemente para o impressionante número de visitantes, cuja maioria provém essencialmente da China continental. Não obstante, é indubitável que a imagem com que Macau se apresenta ao mundo foi conseguida através dos casinos e da indústria do jogo, e a perceção que o turista comum tem é que Macau é a “Las Vegas” do oriente. Por outro lado é indesmentível que Macau é um caso de sucesso a nível mundial e isso não se deve apenas ao jogo. Com efeito o estatuto político, a baixa taxa de impostos, a inexistência de restrições cambiais, a zona aduaneira separada e o porto franco tornaram o território ainda mais atrativo e desempenham igualmente um papel importante no desenvolvimento económico. As autoridades souberam definir uma estratégia que aproveitou as potencialidades do jogo para desenvolver uma série de atividades turísticas conexas. Além do investimento local, a liberalização do jogo também possibilitou a captação de um elevado investimento estrangeiro, o que permitiu desenvolver igualmente o setor dos serviços 2. Os investimentos exigidos, em troca das concessões das licenças de jogo, permitiu-lhes beneficiar de uma série de infraestruturas importantíssimas para a estratégia que definiram, nomeadamente a captação de visitantes pela realização de convenções, exposições, ou o acolhimento de grandes eventos internacionais. Não esqueçamos a gastronomia e o património cultural e arquitetónico, de forte influência portuguesa, que contribui similarmente para a atratividade deste território, que se transformou num dos maiores sucessos económicos da história recente da humanidade.
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5 –Em termos de emprego as categorias cultura, recreio, jogo e outros serviços empregam cerca de 70% da população.
Bibliografia e outras referências: - Portal do Governo da Região Administrativa Especial de Macau (RAEM) - Direção dos Serviços de Estatística e Censos - Departamento de Licenciamento e Inspeção dos Serviços de Turismo - Direção dos serviços de Turismo - Direção de Inspeção e Coordenação de Jogos - Kotler, Philip, Haider, Donald, Rein, Irving, (1993) “Marketing Places. Attracting Investment, Industry, and Tourism to Cities, States, and Nations”, Free Press, Nova Iorque. - Kanter, Rosabeth Moss, (1995), “World Class-Thriving Locally in the Global Economy”, Prentice-Hall.