SpaceX – Um símbolo de inovação espacial
Resumo
Este trabalho aborda o impacto que a SpaceX está a ter no desenvolvimento aeroespacial por iniciativa privada, assim como o modo como esta pode potenciar uma nova orientação para um setor antes promovido exclusivamente por iniciativa pública.
Nesse sentido, analisou-se o mercado em que a empresa se insere com recurso a vários instrumentos leccionados na unidade curricular de Gestão Estratégica.
Dada a natureza pouco conhecida do mercado aeroespacial, tornou-se pertinente fazer uma breve descrição da sua evolução histórica, os vários setores que o compõem e discernir quais os mais pertinentes para o caso em questão.
Finalmente, fez-se uma análise do posicionamento da empresa analisada no contexto do mercado mencionado.
SpaceX, a empresa
Origem
Fundada em 2002 por Elon Musk, um entusiasta espacial, co-fundador do PayPal, da Tesla Motors e da SolarCity, quando confrontado com os custos proibitivamente elevados de materiais de lançamento espacial.
Na busca de materiais de lançamento espacial para um projeto pessoal que visionara, Elon Musk viu-se confrontado com diversos obstáculos em termos de custos. Determinado a fazer melhor do que aquilo que lhe era proposta, decidiu criar uma empresa que desenvolvesse os foguetões a custos mais convenientes de que necessitava.
Objetivos
Atualmente, a SpaceX apresenta-se como uma empresa fabricante de componentes e veículos aeroespaciais, assim como prestadora de serviços de transporte espacial e de desenvolvimento de tecnologias e serviços.
Porém, tem os seus próprios objetivos no que toca à exploração privada, almejando revolucionar tecnologia espacial, tendo por objetivo final permitir que a humanidade habitar outros planetas, o que significa que não depende dos desejos e vontades de exploração dos seus clientes.
É de notar que nasce assim, de um profundo desejo de revolucionar a exploração espacial, a SpaceX, como uma empresa completamente financiada por capitais privados.
Feitos
Foi com acesso exclusivo a capitais privados que desenvolveu o seu primeiro veículo de lançamento – Falcon 1 – e 3 motores de foguetões. No entanto, a ainda breve existência da SpaceX no mercado é recheada de feitos, dos quais merecem destaque:
• O primeiro foguetão de combustível líquido financiado por capital privado a alcançar órbita – 28 de dezembro de 2008;
• A primeira empresa privada a lançar e a recuperar de órbita um veículo espacial – 9 de dezembro de 2010:
• A primeira empresa privada a enviar um veículo espacial até à Estação Espacial Internacional – 25 de maio de 2012
• A primeira empresa privada a enviar um satélite para órbita geoestacionária – 3 de dezembro de 2013
O Mercado Aeroespacial
Com vista a permitir uma melhor compreensão de SpaceX, é pertinente analisar brevemente o mercado em que esta se encontra, assim como apresentar uma breve descrição da sua história e dos vários setores que o constituem, com especial foco nos setores em que a empresa em análise opera.
História
O mercado de veículos aeroespaciais privados foi grandemente influenciado pela existência e desenvolvimento dos satélites comerciais.
Como se sabe, as primeiras décadas da exploração espacial – entre 1950 e 2000 – foram marcadas pelo investimento público e pelo desenvolvimento de agências governamentais na ex-União Soviética e nos Estados Unidos da América. Inicialmente, o controlo governamental sobre os veículos aeroespaciais levou a que só fossem utilizados para efeitos militares.
Todavia, com o surgimento em massa de satélites comerciais sem fins militares, que começaram a ser lançados em massa nas décadas de 1970 e 1980, os veículos e serviços de lançamento cabiam na sua totalidade aos programas espaciais nacionais.
Foi na década de 2010 que o setor privado começou a desenvolver-se e os participantes no mercado a multiplicar-se. Tal não quer dizer que não existissem participantes privados no mercado de desenvolvimento de veículos e serviços aeroespaciais, o que é comprovado pela existência da Arianespace, uma multinacional francesa fundada em 1980 que, em 2004, dominava mais de 50% do mercado de lançamento de satélites para órbita de transferência geoestacionária, sobre a qual desenvolveremos mais tarde.
Análise do Setor Aeroespacial
Para permitir uma melhor compreensão deste mercado, podemos recorrer a várias ferramentas de análise do mercado.
Para começar, iremos realizar uma análise PESTE do mercado aeroespacial. Como tal, temos a perspetiva no âmbito:
• Político & Legal – desastres como a explosão do vaivém espacial “Columbia” afetaram o apoio governamental ao setor de exploração espacial público, podendo ser catastrófico se tal acontecer com uma empresa privada. De igual modo, a investigação espacial deixou de ser tão defendido no campo político, com a excepção das suas possíveis aplicações militares, algo que deriva do escalar de conflitos no mundo;
• Económico – um dos efeitos da recessão mundial e da contínua incerteza económica, leva a que o investimento na exploração espacial, assim como em viagens espaciais, se apresente como supérfluo. Aliada à redução da pertinência deste investimento público, os governos disponibilizam menos fundos para as suas instituições, forçando-as a economizar, o que incentiva o investimento privado.
• Sociocultural – a indústria aeroespacial criou grandes avanços tecnológicos para a humanidade e a exploração espacial tem ganho interesse social dadas recentes conquistas (a descoberta de indícios da presença de água em Marte e o recém feito da SpaceX de aterrar um foguetão após lançamento). De igual modo, e com foco nos Estados Unidos, país de origem da empresa que se pretende analisar, é de realçar a forte ligação nacional com a exploração espacial, assim como com a livre iniciativa privada.
• Tecnológico – a exploração espacial é altamente dependente de I&D, o que exige um elevado investimento nesta área, quer seja por iniciativa pública ou privada.
• Ecológico – o foco em sustentabilidade tem sido cada vez maior, dada a maior preocupação ambiental. Em conjunto com o factor tecnológico, existe uma maior pressão, sobre a indústria aeroespacial, para reutilizar materiais.
De igual modo, é pertinente refletir sobre a evolução deste mercado, reflexão para a qual nos podemos socorrer do industry life cycle.
Atualmente, pode-se considerar que o mercado aeroespacial se encontra no início da fase de declínio, em que a competição, principalmente desde a entrada da SpaceX, começou a ter um maior foco no preço e nos custos.
Esta análise pode ser conjugada com a reflexão sobre o “ocean thinking”, mais concretamente, com a maior concorrência existente neste mercado, o que se traduziria em “red ocean thinking”, ou seja, representando uma indústria que já se encontra bem estabelecida e em que a concorrência é intensa.
A SpaceX no mercado aeroespacial
Com vista a permitir uma melhor compreensão da forma como a SpaceX se enquadra no mercado aeroespacial, devemos começar por indicar quais os setores em que a empresa se insere e a forma como se decide estabelecer no mercado.
Análise da SpaceX no contexto externo
Atualmente, a SpaceX encontra-se nos seguintes segmentos de mercado:
• Produção de veículos de transporte de carga e de tripulação
• Produção de veículos de lançamento
• Produção de veículos de investigação
• Produção de propulsores
• Lançamento de satélites
Analisando a estratégia de afirmação da SpaceX no mercado aeroespacial, estratégia essa que marcou a empresa desde a sua fundação, no contexto das estratégias genéricas de Porter, é possível considerar que seguem uma estratégia clara de liderança pelo preço (cost leadership), em que pretendem alcançar um mercado abrangente.
No entanto, é possível refletir sobre a possibilidade de a SpaceX se encontrar a aplicar uma combinação de estratégias genéricas de Porte, mais concretamente, uma combinação da estratégia por liderança por custo e a estratégia de diferenciação, dados os feitos diferenciadores alcançados pela empresa, através da recente criação de propulsores reutilizáveis.
É pertinente considerar a forma como a SpaceX é capaz de alcançar e de seguir esta estratégia. Para tal, podemos recorrer a uma análise baseada no modelo das 5 forças de Porter:
• A ameaça de novas entradas: o Durante muito tempo, esta indústria foi dominada por entidades governamentais e com vista à sua aplicação militar. No entanto, nos anos mais recentes tem-se assistido à entrada de novos concorrentes com uma capacidade financeira pré-estabelecida que lhes permita fazer face às barreiras existentes à entrada (a necessidade de elevadas quantidade de I&D e os elevados custos de produção). Estas barreiras contribuem assim para uma diminuição parcial da ameaça de novas entradas. o No caso da SpaceX, o seu fundador já se encontrava bem posicionado para a entrada no mercado devido às três empresas de renome que fundara, com a sua capacidade financeira e o facto de as três operarem em áreas que exigem muita Investigação & Desenvolvimento.
• O poder negocial dos fornecedores: o Dados os elevados custos de vários componentes e partes essenciais ao desenvolvimento dos produtos que se dispõe a produzir, a SpaceX viu-se forçada a adoptar uma estratégia de integração vertical, controlando a sua rede de fornecimento. Isto traduz-se na capacidade da SpaceX produzir praticamente todas as partes de que necessita dentro da própria empresa. o Essa capacidade de produção autónoma permite que a SpaceX consiga criar as peças adaptadas às suas exatas necessidades, o que permite um muito maior controlo sobre qualidade, uma drástica redução de custos e um mais rápido loop de feedback entre as equipas de design e de produção.
• O poder negocial dos compradores: o O facto de competir em vários setores e de concorrer a parcerias com vários governos permite que a SpaceX seja capaz de aplicar economias de escala à indústria aeroespacial.
• A ameaça de produtos e serviços substitutos: o A existência de produtos e serviços substitutos é extremamente reduzida, uma vez que os avanços tecnológicos nesta área, dada a sua complexidade, se efetuam a um ritmo lento, impossibilitando o surgimento repentino de produtos que pudessem, subitamente, substituir os produtos que a SpaceX produz;
O último ponto da análise com base nas 5 forças de Porter, a concorrência entre concorrentes existentes, merece uma reflexão mais destacada dada a complexidade do setor, permitindo assim obter uma breve análise da concorrência que a SpaceX enfrenta.
Assim, de forma a permitir uma mais acessível compreensão da concorrência entre concorrentes existentes no mercado, procederemos à divisão desta análise por segmentos de mercado em que a SpaceX se posiciona e focar-nos-emos naqueles em que existem concorrentes de destaque, mais concretamente o segmento dos veículos de transporte de carga e de tripulação e o de lançamento de satélites.
No segmento de veículos de transporte de carga e de tripulação, assim como de veículos de lançamento, é necessário mencionar a presença neste segmento da Virgin Galactic e da Interorbital Systems:
• No caso da Virgin Galactic, é pertinente realçar o facto de pertencer ao Grupo Virgin, potenciando a sua capacidade de incorrer nos custos de entrada, contrastando porém com a polémica em que a empresa se viu envolvida após o desastre de 31 de outubro de 2014 que vitimou um dos pilotos.
• No caso da Interorbital Systems, é relevante mencionar que, embora tenham desenvolvido um design de foguetão de lançamento reutilizável com bons resultados, a sua linha de veículos de lançamento “Neptune” encontra-se estagnada desde 2011.
No segmento de lançamento de satélites, o concorrente mais digno de nota é a Arianespace:
• A Arianespace SA é uma multinacional francesa fundada em 1980 como o primeiro fornecedor comercial de serviços de lançamento. Os seus principais accionistas são também os seus fornecedores, mais concretamente, vários Estados pertencentes à União Europeia. É de notar que, em 2004, a Arianespace detinha mais de 50% do mercado mundial de lançamento de satélites para a órbita geoestacionária, uma posição que foi afetada pela entrada da SpaceX, entrada essa que pressionou a política de preços da empresa, obrigando-a a cortar na mão-de-obra e a focar-se no corte de custos, com vista a conseguir manter-se competitiva.
• É de notar que a SpaceX tem vindo a absorver parte da quota detida pela Arianespace graças à estratégia genérica de Porter seguida.
Desde modo, é possível concluir que a SpaceX, graças à combinação da estratégia de diferenciação e de liderança por custo, consegue enfrentar os desafios que se lhe impõe por parte dos principais concorrentes.
Análise da SpaceX no contexto interno
No entanto, é necessário, após a reflexão realizada ao contexto circundante da empresa em análise, proceder à observação da própria empresa e da forma como esta cria valor. Tendo essa análise em mente, podemos recorrer a várias ferramentas.
Para começar, podemos basear-nos nos quatro critérios através dos quais as capacidades podem ser avaliadas em termos de providenciar uma base para alcançar uma vantagem competitiva sustentável – VRIN:
• Valor – a SpaceX consegue trazer valor aos seus clientes. o Um dos seus maiores clientes é a NASA que, vendo o seu orçamento bastante reduzido em comparação com os tempos áureos da corrida ao espaço, tem optado por contratos com empresas privadas. Além dos vários contratos assinados para prestação de serviços de transporte de carga até Estação Espacial Internacional (em dezembro de 2008, ganhou um contrato para 12 viagens de abastecimento à Estação no valor de 1.2 mil milhões de dólares), a SpaceX ganhou um contrato de desenvolvimento de sistemas de transporte de tripulação até à Estação Espacial no valor de 2.6 mil milhões de dólares. o No entanto, a SpaceX consegue trazer valor generalizado a todos os seus clientes, não apenas à NASA. Em junho de 2010 conseguiu o maior contrato até à data de lançamento de satélites, no valor de 492 milhões de dólares, para lançar a constelação de satélites Iridium. É também pertinente mencionar que, em 2014, a SpaceX conseguiu 9 dos 20 contratos a nível mundial para prestação de serviços de lançamentos comerciais, levando ao primeiro ano, desde há algum tempo, em que nenhum serviço de lançamento comercial era marcado nos serviços russos.
• Rarity – A SpaceX possui capacidades raras que poucas empresas na área conseguem. o O facto de ter optado por uma estratégia de integração vertical, tornando-se a sua própria fornecedora de componentes, levou a que a empresa possuísse um elevado número de patentes, sendo de realçar que a empresa foi das únicas entidades privadas no setor a conseguir tirar partido das económicas de escala. o De igual modo, é pertinente mencionar que a SpaceX se apresenta como uma marca poderosa, recuperando o interesse pela exploração espacial existente na época da corrida ao espaço, além de ser liderada por alguém cuja imagem de marca lhe conferiu um estatuto de celebridade.
• Inimitabilidade – a SpaceX tem capacidades que os concorrentes têm dificuldade em obter. o A capacidade de basear toda uma empresa aeroespacial em economias de escala e numa rede de integração vertical apresenta-se como algo que os concorrentes da SpaceX têm dificuldade em imitar; o No entanto, alguns dos serviços que apresenta não são impossíveis de imitar, como é o caso dos seus foguetões reutilizáveis, algo que outras empresas aeroespaciais também já conseguiram construir.
• Não substituibilidade – A vantagem competitiva pode não ser sustentável se existir ameaça de substituição. o É relevante mencionar que, embora as componentes criadas e usadas pela SpaceX possam ser únicas, exclusivas e inimitáveis, tal não significa que os seus concorrentes não possam apresentar ou desenvolver componentes que possam substituí-los, o mesmo se aplicando a serviços ou produtos de lançamento ou transporte
De forma a completar a análise da SpaceX, procederemos agora à análise SWOT da empresa, analisando as suas forças, fraquezas, oportunidades e ameaças.
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